08/10/2025
Um dos mais importantes nomes da literatura e das artes contemporâneas de língua portuguesa, Valter Hugo Mãe construiu uma trajetória marcada pela sensibilidade, pela experimentação e pela delicadeza com que aborda o humano em todas as suas contradições.
Autor de títulos célebres como “A Máquina de Fazer Espanhóis”, “O Filho de Mil Homens” e “A Desumanização”, também atua como artista plástico, exercendo um trabalho visual que dialoga com o que escreve: é detalhista, cheio de repetições gráficas, obsessões e gestos quase caligráficos que lembram a sua cadência textual.
Essa verve marca no cartaz da 49ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, assinado pelo escritor português. Além de emprestar suas linhas sinuosas e formas orgânicas para esta edição, Valter Hugo Mãe também é celebrado na programação com a exibição de filmes sobre sua obra e a realização de uma masterclass com o autor.
Dois filmes que dialogam com sua produção fazem suas estreias mundiais na Mostra: “O Filho de Mil Homens”, dirigido por Daniel Rezende, e “De Lugar Nenhum”, realizado por Miguel Gonçalves Mendes.
Adaptação do best-seller homônimo lançado em 2011, o longa “O Filho de Mil Homens” narra a história de Crisóstomo, um pescador de 40 anos que cresceu isolado da sociedade e sonha em ter um filho. Convencido de que “quando se sonha grande, a realidade aprende”, ele parte em busca de relações verdadeiras, inventa uma família atípica e reúne personagens tão excêntricos quanto humanos.
Entrelaçando histórias não lineares em uma trama múltipla e delicada, o pescador conhece Camilo, um garoto de 12 anos, filho órfão de Francisca, uma mulher com nanismo. Camilo o incentiva a procurar uma companheira, e assim Crisóstomo encontra Isaura, uma mulher desonrada e afundada na solidão, casada com Antonino, um homem sensível e frágil.
Com simplicidade e ternura, Crisóstomo desconstrói nossa visão de masculinidade ao reunir personagens que sofreram e foram rejeitados pela pequena vila litorânea fictícia, em uma ode àqueles que resistem e conseguem se conectar verdadeiramente por não se prenderem às convenções sociais nem às crenças limitantes da sociedade.
Já o documentário “De Lugar Nenhum”, filmado ao longo de sete anos, acompanha Valter Hugo Mãe na escrita do seu romance “A Desumanização” — entre viagens pela Islândia, Brasil, Portugal, Colômbia e Macau. Uma meditação visual sobre solidão, perda e pertencimento, com participações da cartunista Laerte Coutinho e do compositor islandês Hilmar Örn Hilmarsson, mentor de bandas como Sigur Ros e Bjork.
O filme integra o projeto “O Sentido da Vida”, no qual o diretor Miguel Gonçalves Mendes trabalha há mais de uma década — um conjunto de nove longas-metragens que assentam num caleidoscópio de figuras contemporâneas, em que o realizador nos convida a refletir sobre o que faz de nós, humanos, seres singulares.
Além das exibições dos filmes, um bate-papo com Valter Hugo Mãe encerra o V Encontro de Ideias Audiovisuais. Na masterclass gratuita, que será realizada em 25 de outubro, às 21h, na Cinemateca Brasileira, ele, Miguel Gonçalves Mendes e a cartunista Laerte conversam sobre “De Lugar Nenhum”.